A morada de uma casa

Veio o anoitecer trazer as tonalidades mais escuras do azul ao mar, ao céu, às ilhas, e às diferentes espessuras da bruma que as cobre meiga.
O barco, mareando à mesmíssima velocidade a que a noite cai vai passando incógnito, sereno por entre todos esses azuis que cobrem o que existe- e também eu, ao longe, estou vestido de azul. Consoante a distância se ergue o meu, agora, fato muda como muda o tamanho das ancoradas jangadas de pedra.
Depois, embora sabendo que tudo continua igual e genuíno, tudo desaparece, tudo engolido pela noite que impera e pela distância que continuou a crescer, mas lentamente. E assim quase já não me recordo de como era esse azul, por tudo ter desaparecido e se transformado lentamente em negro, mas um negro profundo- que em mim se foram também transformando as memórias por onde vagueavam os tais azuis.
Agora lembro-me de lhe chamar azul e das suas sensações provocadas em mim mas vejo-o negro, esse negro onde nada habita senão a profundidade sem fim.
Navega o barco nesse infinito mundo e eu desapareço com ele rasgando a negrura feita em mar, existindo sempre, todavia, oculto e sem morada nesse mapa onde todo o tamanho é uma só casa.
(Obrigado pela foto, zoy) Costa do Adriático grego.