Pedras e pianos

Quando a areia se enrola com as ondas do mar, e o céu é cinza e chora, miramos o pélago distante, as cores dos reflexos, e o imenso espaço que as acolhe. Ouve-se o vento e o mar murmurando às roupas e às curvas de nossas faces.
Na aragem fresca desse fim de tarde passeiam-se os sons do burburinho das folhas verdes de uma primavera já velhinha e caminha-se em passos lentos ao alto dos montes, onde as pedras são confortáveis sofás e as árvores contadoras de histórias de mundos simples.
Contam-se os passos, atravessam-se espaços nossos e os caminhos de terra são castanhos de um deslumbramento só, onde se perdem os olhares no percurso da perspectiva e se lançam outros na continuidade do horizonte. Depois revelam-se os vales dando-se suavemente aos montes na plena e natural simbiose das encostas, e o belo manifesta-se também em nós, em melodias que nos povoam claras como a água das minas que brota simplesmente. E o banquete de cores e odores é-nos servido. Descemos ao vale, corremos a várzea, e olhamos mais uma vez a encosta, percorremo-la com a alma e ao chegar ao cume prendemo-nos suspensos por momentos na sua altitude antes de voltar as costas ao gesto setentrional e regressar a casa amando tudo o que nos foi dito e nada mais. Nada mais.